Kenned tinha 4 anos em 1986 quando foi visto
pela última vez.
Todos os dias, há 29 anos, a comerciante de
Mogi das Cruzes (SP) Divanei Pereira, de 50 anos, faz uma oração especial pela
manhã. É um pedido para que o filho Kenned Robert Pereira esteja bem e que um
dia possa voltar para a casa.
O menino desapareceu misteriosamente no dia
11 de abril de 1986, com 4 anos de idade, e nunca mais foi visto. E em todos os
meses de maio, especialmente no Dia das Mães, a comerciante renova as
esperanças de rever o filho: "Espero que este seja o último Dia das Mães
que eu passo sem o meu filho. Eu não perco as esperanças. Ele ainda vai voltar
e sempre será o meu menino, pois aquele rostinho de criança dele está congelado
na minha mente", desabafa a comerciante Divanei.
Segundo a mãe, no dia do desaparecimento
havia muitas pessoas em um pico perto de onde a família morava, em Mogi, para
observar a passagem do cometa Halley. "Acredito que ele não esteja no
Brasil. Deve ter sido levado por alguém para outro país. Atualmente, depois de
tudo o que passei, estou preparada e posso dizer que perdoo a pessoa que pode
ter levado o meu filho embora", diz a comerciante.
Se estiver vivo, Kenned é um homem de 32 anos
completados no dia 22 de fevereiro. As fotos de criança são de um menino de
cabelos loiros e encaracolados. A mãe guarda os poucos retratos do garoto,
assim como um caminhão de plástico dos bombeiros. "Ele amava este
brinquedo", lembra.
Segundo Divanei, a infância do menino foi
feliz. "Era uma outra época. Não tinha esse perigo que temos hoje de
deixar crianças na rua. Nós morávamos em um bairro com ruas de terra. Minha mãe
e minha sogra viviam a poucos metros da minha casa", detalha.
No dia 11 de abril de 1986, por volta das
16h, a comerciante deixou os filhos Kenned e Karina, de 5 anos, na casa de sua
mãe, a poucos metros de onde morava, no bairro Ponte Grande, em Mogi das
Cruzes. A comerciante e o marido foram ao centro da cidade. "Era um dia
bonito, estava sol. Meus filhos estudavam em uma escolinha no jardim da
infância, mas não consigo me lembrar o motivo pelo qual eles não foram à aula
nesse dia", detalha. Por volta das 18h, o casal retornou à Ponte Grande.
Divanei foi para a casa e pediu para que o
esposo fosse buscar as crianças na casa da mãe dela. "Ele voltou somente
com a Karina e me disse, nessas palavras, 'Bem, eu não achei o Kenned'. Fui
correndo para a casa da minha mãe. O menino desapareceu enquanto brincava na
rua e a avó não tinha percebido. "A noite caiu e nós notamos que ele
[Kenned] realmente havia sumido", lembra a comerciante.
Uma grande mobilização tomou conta da cidade.
A mogiana diz que vieram policiais de São Paulo para ajudar nas buscas. "Por
vários dias esses policiais fizeram buscas no Rio Tietê, já que havia suspeita
de que meu filho pudesse ter desaparecido por lá", explica. O tempo passou
e cada vez mais as notícias sobre o possível paradeiro do menino iam se
diluindo. "Eu era uma garota de vinte e poucos anos. Fiquei muito
deprimida e emagreci bastante. Cheguei aos 43 quilos", conta.
O misterioso sumiço da criança ganhou
destaque na imprensa de Mogi das Cruzes e de todo o Brasil. Divanei mantém boa
parte destes recortes de jornais da época. Em 2002, uma revista americana
divulgou uma matéria mostrando como seria o rosto de Kenned aos 18 anos. A
técnica de evolução da face, segundo a comerciante, foi feita pela polícia
americana, a Swat. Para chegar ao suposto rosto do menino, eles usaram
características da mãe, pai e irmã:
"Eu era associada a 'Mães da Sé'. Eles
[Swat] escolheram o Kenned para fazer este trabalho por causa do tempo em que
ele já estava desaparecido", justifica.
O caso foi investigado em Mogi das Cruzes e o
delegado que comandou os trabalhos, na época, já se aposentou e não foi
localizado. O G1 entrou em contato com a Secretaria Estadual de Segurança
Pública, mas por se tratar de um caso antigo a polícia não possui registros
sobre o desaparecimento. Em nota, a SSP informou que a delegada titular da 4ª
Delegacia de Pessoas
Desaparecidas do DHPP, Maria Helena do
Nascimento, está à disposição da família para inserir o desaparecimento no
Banco de Dados da Polícia Civil, mediante comparecimento da mãe à delegacia.
A mãe do menino disse que irá a São Paulo
para conversar com a delegada. "Irei me programar para ir ao DHPP o mais
rápido possível. Essa atualização é muito importante", diz Divanei.
Cometa
Halley
Divanei tem uma suspeita: o filho pode ter
sido levado por pessoas de outros países que visitavam Mogi das Cruzes no dia
do desaparecimento. "Havia um grande movimento de pessoas estrangeiras e
de posse na cidade. Naquela noite o cometa Halley passaria perto da Terra. Por
isso, havia muita gente seguindo em direção ao Pico do Urubu. E todo esse
engarrafamento de carros passava justamente na nossa vizinhança", conta.
Por causa dessa suspeita, Divanei tem quase certeza de que seu filho esteja
vivendo em outro país. "Ele deve estar bem", afirma.
DNA
Em 1996, um programa de televisão encontrou
um menino com as mesmas características no estado de Alagoas. Mas, após dois
exames de DNA, ficou compravado que não se tratava de Kenned. "Foi uma
frustração. Eu tinha certeza que era meu filho. O Marcelo [menino encontrado]
possuía uma cicatriz no pé identica à do Kenned. Mas os exames apontaram que
não era ele. Essa criança foi encontrada em um orfanato em Alagoas",
explica.
Desde então, Divanei não teve nenhuma outra
pista concreta sobre o paradeiro da criança. Desde 2013, a família mantém uma
página em uma rede social, com fotos de como seria o rosto de Kenned aos 18
anos e o tipo sanguíneo dele. No espaço também há fotos de recortes de jornais
e informações do caso. Além do idioma português, a página tem versões em inglês
e espanhol.
Atualmente, Divanei continua trabalhando como
comerciante em Mogi das Cruzes. Ela vive com o marido e a filha mais nova,
nascida anos após o desaparecimento do irmão, em um outro bairro. A outra
filha, que estava com Kenned no dia do desaparecimento, se casou, conforme
disse Divanei. "Assim vou levando a minha vida. Nunca me culpei pelo
acontecido e atualmente não culpo e não tenho raiva de ninguém. Aprendi que não
se cai uma folha de uma árvore sem que Deus permita. Enquanto houver um fôlego
de vida, sempre haverá esperança", concluiu.